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segunda-feira, 22 de agosto de 2011

O ESTADÃO E OS MILITARES



Sou leitor de “O Estado de São Paulo” há muitos e muitos anos. Por pura falta de opção. E também porque sei o que eles pensam, sei o que eles são – uma direita um pouco (só um pouco) mais ética que os demais órgãos de imprensa de direita desse País, como a “Folha de São Paulo”, por exemplo, que tem um triste passado e um presente ainda nebuloso de apoio explícito e sem nenhuma desculpa seja ela filosófica ou apenas interesseira à elite da direita desse País..


Sei que o Estadão não gosta do Lula. Sei que o Estadão não gosta do PT. Sei que o Estadão critica os governos Lula/Dilma. Sei que o Estadão morre de amores pelo FHC, seu queridinho de todos os tempos, e pelo PSDB. Isso não chega a me incomodar. Porque ignoro olimpicamente as reportagens, os editoriais e tudo quanto eles escrevem sobre política nacional. Penso que há outras coisas melhores para ler, nesse jornal, até mesmo na política internacional, em que eles são claramente pró-judeus. Isso também não me incomoda muito. Afinal, é melhor que tenham uma opinião mais ou menos clara a não ter nenhuma e ficar me enganando.


Enfim, sou leitor do Estadão. E tenho boa memória. Coisa que o próprio jornal não tem. Vejam: eles apoiaram – como praticamente toda a grande imprensa brasileira – o famigerado golpe militar de 1964. Apoiaram e, depois, dançaram: tiveram problemas sérios com a censura dos milicos. Lembro-me bem dos poemas de Camões no vetusto jornalão e das receitas no Jornal da Tarde. Censura brava.


Mas o Estadão parece que se esqueceu de tudo isso. De quanto os milicos os incomodaram e de como os milicos se estabeleceram em suas redações para coagir, para proibir, para perseguir. A liberdade de imprensa, de que eles desfrutam hoje, naquela época era uma espada muito bem afiada sobre suas gargantas. No entanto, o Estadão parece que não se lembra. Hoje, nestes tempos de total liberdade – falem o que quiserem, mas a tal censura de que eles reclamam todos os dias é problema judicial e não político – nestes tempos, repito, de total liberdade, eles, por dá-cá-aquela-palha bajulam escandalosamente os militares. Por qualquer motivo, lá vão eles ouvir a opinião da caserna ou, como no caso da demissão há pouco do Ministro da Defesa. (que era e é um dos seus queridinhos, por ter sido também ministro do FHC), foram logo inventar uma pequena crise militar, foram logo dizer que havia descontentes nas Forças Armadas, por causa da escolha do novo ministro: aqueles mesmos e velhos empijamados militares de outrora, que os censurou e que, se ainda vivos, continuam ruminando o seu ódio à democracia. E então, o Estadão vai lá e enche a bola desses... – não, não vale a pena adjetivá-los. Valia a pena esquecê-los.


Mas não o Estadão: sempre que há algum pequeno motivo, os jornalistas do Estadão ressuscitam essa gente. Claro, para alfinetar o Governo democrático que permite que eles cometam suas barbaridades opiniáticas, suas diatribes contra qualquer coisa que realizem os governos democraticamente eleitos, empossados e, felizmente, governando para o povo. Coisa que os milicos de que eles sentem tanta saudade não fizeram.


Mesmo assim, eu ainda leio o Estadão. Até quando? Não sei: minha paciência anda se esgotando. Eles estão ficando cada dia mais furibundos na sua crítica sem critério. Começam a atravessar a tênue linha da ética jornalística: estão querendo, como o fazem todos os seus demais concorrentes de direita, cada vez mais influir no voto do cidadão, na vontade do povo. E com isso, não posso e não vou concordar nunca: um órgão de imprensa não pode e não deve jamais querer interferir na vontade do povo, porque isso não é democrático, não é republicano, não é lógico. Podem, sim, ter sua opinião, devidamente sinalizada em editoriais, em artigos etc., mas nunca através de reportagens, através do noticiário ou através de mensagens pretensamente subliminares, numa verdadeira molecagem que não é digna da tradição que eles dizem preservar, e que eu sempre respeitei. Aliás, é muito mais por essa digna tradição – embora de direita, o contrário do que eu penso – é que eu ainda consigo ler o Estadão! Até quando, não sei.


Por que toda essa diatribe?


Leia e analise bem, meu caro leitor e leitora, a matéria abaixo. E vejam até que ponto vai a desfaçatez de gente que está literalmente cuspindo no prato em que come, para privilegiar o jantar indigesto que lhe foi oferecido pelos milicos de 1964, que eles, agora, tanto bajulam, para tentar atingir um governo realmente democrático.


Até quando vamos engolir esse tipo de imprensa?



Estadão “crava” a espada em Dilma


Publicado em 22/08/2011





por Rodrigo Vianna

A foto está na página A-7, na edição impressa do Estadão. Dilma surge levemente arqueada, e a espada de um cadete parece trespassar o corpo da presidenta. Abaixo da foto, o título “Honras Militares” – e um texto anódino, sobre a participação de Dilma numa cerimônia militar.


Faço a descrição minuciosa da foto porque a princípio só contava com uma reprodução de má qualidade (tive que fotografar a página do jornal com uma máquina amadora). Mas um amigo acaba de me mandar a imagem por email – e essa está um pouco mais nítida. Estranhamente, não encontro a foto no site do Estadão. Talvez apareça naquela versão digital para assinantes…


O editor deve ter achado genial mostrar a presidenta como se estivese sendo golpeada pelas costas. É a chamada metáfora de imagem. Mas, expliquem-me: qual a metáfora nesse caso? O que a foto tinha a ver com a solenidade de que fala o jornal? Há, no meio militar, quem queira golpear Dilma pelas costas? O jornal sabe e não vai dizer?


Ou, quem sabe, a turma do “Estadão” tenha achado graça em “brincar” com a imagem. No mínimo, um tremendo mau gosto com uma mulher que já passou por tortura na mão de militares, e hoje é a presidenta de todos os brasileiros.


Sintomático que a foto não apareça ao lado da mesma notícia na edição digital. Alguém deve ter pensado melhor e concluído: não vai pegar bem.


Por isso tudo, sou levado a pensar que Freud talvez explique a escolha da foto: a mão militar, na imagem, cumpre a função de eliminar a presidenta. E, com isso, talvez agrade a certa parcela dos leitores do jornal.



O Conversa Afiada reproduz post de Rodrigo Vianna, no Escrevinhador:
http://www.conversaafiada.com.br/pig/2011/08/22/estadao-crava-a-espada-em-dilma/
Redação Conversa Afiada

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